terça-feira, 31 de julho de 2012

San Francisco (parte 3) Egidio, o chefe italiano sósia de Frank Zappa


Egidio, o chefe italiano sósia de Frank Zappa
Egidio é uma figuraça. Magro e nariz comprido, cavanhaque e bigode muito pretos, lembra o guitarrista americano Frank Zappa.  Estava sozinho no salão, no meu primeiro dia, aguardando o check in abrir, quando ele passou por mim, puxou papo. “De Porto Alegre?”, diz ele. “É gaúcho!, eu também sou gaúcho!”, tentando me convencer que era brasileiro. “Somos os dois únicos gaúchos aqui”, me apontando um grande quadro acima da entrada da cozinha “Taqueria GAUCHO’S”.

E gídio é de Roma e está fora da Itália há anos, pulando de lugar em lugar. Veio a San Francisco e ficou hospedado no Green Tortoise na primeira vez. Depois voltou mais meia dúzia de vezes, sempre ficando lá, até que  um dia substituiu o cozinheiro, foi contratado e não saiu mais. Na sua cozinha há fotos de Fran Zappa espalhadas pelas paredes e portas. Ele diz que não é tão fã assim de Frank Zappa, é só coincidência o similaridade. Enquanto cozinha e limpa escuta rock antigo, como Kiss, Led Zeppelin, AC~DC. Durante um café da manhã ele sobe no palco para pedir que não desperdicem comida, pois muita gente se serve demais e acaba jogando fora bagels inteiros. Quando está de bom humor, canta, normalmente em espanhol ou italiano.


Três vezes por semana há jantar grátis no albergue, e os hóspedes são bem-vindos se quiserem ajudar na cozinha. Me interessei, mas como não gostaria de ter que lidar com carne, me esquivei. O menu foi comida mexicana: guacamole, tortillas, salsa picante, feijão refrito, feijão normal  e salada. Tudo ótimo, e sem carne.
Então na segunda noite de jantar me voluntariei. O tema era comida indiana: curry picante de grão de bico e curry de vegetais. Mais 4 ou 5 pessoas estão lá. Tive tarefas variadas: cortei inhame em cubos, lavei toda a louça usada para a preparação dos alimentos, e fiquei responsável por mexer o curry de vegetais enquanto ele vinha adicionar mais ingredientes. Depois de uma hora mexendo a colher de ferro, ganhei um belo calo. A comida estava totalmente excelente. Mas o mais impressionante foi o talento de Egidio em reger a cozinha, dividindo as tarefas de acordo com seu feeling, pois cada um ali tem níveis de habilidade culinária diferentes (notei que os menos experientes lidam  apenas com a salada).  O jantar é sempre um evento. Cerca de 60 ou 70 pessoas no salão. Antes de servirmos a mesa,  alguém chama os nomes dos voluntários para agradecer  pela participação, até que se cite Egidio, aplaudido sempre no final.


Entre esse jantar e o outro, me acostumo a ajudar pela cozinha: lavando pratos, preparando o salão, recolhendo as bandejas de comida no final, e assim vou conversando mais com Egidio, que me diz que sou como ele, e que deveria era ficar na cidade, sugerindo que eu deveria ficar de olhos abertos para as oportunidades.

Quando chego para ajudar no meu segundo jantar (comida italiana), há menos voluntários, portanto mais trabalho. Como já estou com mais intimidade com a cozinha, tudo flui melhor. Fazemos penne com molho de tomate e legumes, e pão com alho. Apenas para o pessoal da cozinha, fazemos bruschetta. Uma mulher toca pela quinquagésima vez fur Elise ao piano. Egidio quase perde a paciência, dizendo que vai pedir pra ela parar. O trabalho é contínuo, cortar tomates em cubos para o molho, cortar tomates em pedacinhos para a bruschetta, cortar cebola, lavar panelas, facas e talheres, cortar os pães, colocar os pães no forno, fazer a mesa, abrir latas, misturar a massa com o molho, etc, mas o ambiente é  relaxado e divertido, com um alemão, um catalão, francesa e um brasileiro sendo guiados por um chef italiano. Ganho calos e uma queimadura que devo levar de recordação, mas vale muito a pena a experiência de ajudar a cozinhar pra dezenas de pessoas.


No dia em que vou embora, Egidio se senta à minha mesa com papel e caneta nas mãos e diz que vai me escrever “una lettera”. É a receita de curry de grão de bico que lhe pedi no dia anterior.

Luvas e tênis combinando
Alemão e brasileiro fazem prato italiano

Frank Zappa e eu

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