sexta-feira, 22 de abril de 2011

Os Idosos

Em literatura ou no cinema, não gosto muito da crítica que avalia uma obra comparando-a a outra. Acho que a coisa deve ser considerada pelo o que ela é, não pelo que o crítico acha que ela deveria ter sido (isso no caso de obras de autores distintos, claro). Mas comparar cidades é inevitável, e as características de Vancouver que mais saltam à vista na chegada são justamente aquelas coisas que não existem em Porto Alegre (ou no Brasil). Por exemplo, o aspecto multirracial, a abundância de idosos nas ruas e a (chocante) falta de cheiro de urina nas calçadas do centro.


Aos idosos.


Estão por tada parte, caminhando devagar, mas quase sempre sozinhos, às vezes com ajuda de muletas, andadores ou carrinhos elétricos. Estão nos cafés, nos supermercados, nas praças e também trabalhando. Nos postos de informação turística a chance de ser atendido por alguém de pele enrugada e cabelos brancos é de 90%. E atendem com sorrisos, disposição, cortesia, interesse e, pode-se dizer, orgulho. Aí você diz: "Que bom que dão oportunidades de emprego para os idosos, afinal a grana da aposentadoria pode não ser suficiente pra levar uma boa vida", sem saber que boa parte deles está ali fazendo trabalho voluntário.
Nas suas, sempre que você parar meio perdido, com um mapa na mão, a primeira pessoa a oferecer ajuda será um idoso.


Os idosos são tão ativos e presentes que depois que você se acostuma com isso, acaba acontecendo um estranho fenômeno: você para de vê-los como velinhos e passa a enxergá-los como realmente são: apenas pessoas como as outras, cujos corpos tiveram a infelicidade de envelhecer.


(ah, perdoem a absoluta falta de fotos nas postagens até agora. Tenho feito várias, mas ainda tenho alguns problemas técnicos para resolver.)

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Ainda no avião

Eu sempre penso que andar de aviao e' bom. Mas acho que apenas porque contraponho a quilometragem coberta pelo aviao ao tempo que levaria para cobrir a mesma distancia de onibus (esse sim uma das provas concretas do poder do demonio). E ai' quando entro no aviao a fantasia da lugar 'a realidade: horas enfiado num assento que nao permite movimentos corporais muito criativos, limitando a pessoa a exercitar apenas as palpebras, a ponta dos dedos e as orelhas (uma vantagem para aqueles bizarros que sabem mexer as orelhas); criancas chorando na poltrona de tras; zumbido nos ouvidos; enjoo; turbulencia; criancas chorando na poltrona da frente.

E foi justamente com a ponta dos dedos que operei uma das melhores distracoes do voo de mais de 10 horas de Sao Paulo aToronto (e depois em mais outro de 4,5 horas de Toronto a Vancouver). Em uma tela sensivel ao toque, podia escolher (em ingles ou frances) programacoes de filmes, musica, documentarios, noticias e acompanhar ao vivo o trajeto do voo num mapa. Entre os filmes, por exemplo, era possivel escolher entre hollywood, canadenses, infantis, alternativos, classicos, etc. Havia Stanley Kubrick, Woody Allen, Chaplin e outros. Essa programacao interativa so era interrompida pelos anuncios da tripulacao (que iam desde horario do jantar ateh pedidos de apertar o cinto por causa da turbulencia). Isso sempre precedido por um sinal sonoro repetido.

Comecei a ver alguns (como o oscarizado Cisne negro), sem terminar, interrompido pelo sono que aparecia aleatoriamente. Entre as musicas, selecionei Frank Sinatra, tambem bom para dormir. E dormi. Todo torto, mas dormi. E acordei com o bip do capitao tocando insistentemente nos meus ouvidos. Abri lentamente os olhos ("ja chegamos?") e tive uma dasagradavel surpresa: letras garrafais piscavam em um fundo vermelho: "COMPUTER MALFUNCTION - COMPUTER MALFUNCTION". Pronto, pensei, ja era. C`est fini. E dois segundos depois ja havia me convertido ao budismo, ao judaismo, ao espiritismo e ja estava prestes a virar um fervoroso catolico apostolico romano e garantir meu lugar no ceu quando, ao final do terceiro segundo, me dei conta de que adormecera assistidno a 2001 - Uma odisseia no espaco. Dã pra mim.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Primeiras Horas

(infelizmente o teclado que uso nao tem acentos, nem til, nem cedilha, portanto, paciencia)


Sai de casa em  Porto Alegre  as sete da manha de domingo, e so cheguei em casa em Vancouver as dez da noite de segunda (duas de manha de terca feira). Nao devo ter dormido mais que 5 horas nesse meio tempo, que passei ou em poltronas apertadissimas de aviao ou zumbizando em filas de aeroporto.

Como era de se esperar, so depois que cheguei aqui que fui me dar conta de todas as coisas que havia esquecido em casa. Entre elas o cabo pra descarregar fotos da camera no pc, entao por agora os posts vao sem qualquer ilustracao.

Nessas ultimas 50 horas vi tanta coisa que anotei mentalmente pra contar aqui, mas ja esqueci de 90%. Talvez elas voltem aos poucos noutro momento.

Estou escrevendo alucinadamente rapido e sem concentracao no momento, mas achei melhor que nada.

Tenho que correr pois a janta aqui e as 6 da tarde(!) e moro do outro lado da cidade, tendo que atravessar um rio e subir um morro.

domingo, 10 de abril de 2011

Primeiro Post - Ainda no Brasil

Confesso que estava reticente com a ideia de criar mais um blog apenas para contar minhas desventuras de viagem, afinal já tenho mais uma meia dúzia de outros blogues inúteis não lidos por milhares de pessoas no Brasil inteiro. Mas não resisti.

Ainda não tenho ideia de com que regularidade conseguirei postar, ainda não sei bem o que me espera. Mas noutro país tudo muda. Talvez, até, a disposição para escrever blogues.

Quando fui para os EUA, quase onze anos atrás, dias antes de embarcar escrevi na primeira página do meu blog de papel que me sentia "mais lá do que aqui". Algo parecido ocorre agora, vivendo meus últimos momentos no Brasil, já em clima de despedida há dias.


Naquela ocasião, viajei para fugir. Não me dava conta de que os problemas viajariam sempre comigo. Mas eu era um jovenzinho imaturo que ainda não sabia lidar com as coisas do mundo. O que mudou é que agora sou um adulto imaturo que também não sabe lidar direito com as coisas do mundo.
Na verdade a principal mudança que percebo agora - e que me assusta - é uma certa tendência para ficar mais emocional e apegado às pessoas, e isso, como sabemos bem, é a porta de entrada para a breguice. Percebi um sintoma disso ao parar minha vizinha de andar outro dia para elogiar o seu tapete Welcome novo. Claro que ela ficou feliz, mas, obviamente, esse não sou eu. Também me peguei escutando com paciência e interesse a zeladora do meu prédio me contar por quinze minutos, enquanto eu tentava embarcar no elevador, como tem sido a sua tentativa de parar de fumar. Outro dia então foi assustador. Passei de ônibus ao lado de um parque num dia de sol e achei que as árvores com suas folhas douradas ao vento formavam uma paisagem bonita. Árvores bonitas?! Logo eu, que se precisar decidir entre salvar do incêndio uma floresta ou shopping center, logo vou pensar nos cinemas e livrarias que seriam perdidos.


Me flagro pensando também se não vou morrer logo antes de ir. Ando de bicicleta e penso que vou acabar embaixo de um ônibus, sinto uma leve dor no peito e já acho que é o prenúncio de algo fatal. Ah, claro, e tem o avião, essa coisa absurda que voa. É até estranho pensar em formas não voluntárias de morrer. Mas nada disso é apreensão, talvez seja um reflexo inconsciente para aquilo que penso sobre os que viajam: morrem um pouco para os que ficam. Mas, como eu respondi para uma amiga que falou "Então quer dizer que tu vai nos deixar?": "Não, vocês é que vão ficar".


...

Tá, mas o que tu vai fazer? Onde vai morar? Volta quando?
As dúvidas de todos também são as minhas. Não sei quase nada, praticamente um Sócrates. Mas quando souber dou notícias.


Enfim, espero que nos próximos posts eu seja mais objetivo, evitando ao máximo o desnecessário tom confessional, para o bem de todos os leitores.