terça-feira, 10 de julho de 2012

EUA - Costa Oeste - Seattle (parte 2)




Sete e meia da manhã, tomo café com Henrietta. Café é modo de dizer, não tomo café nem leite, então fico com um suco, extremamente doce. Vou com ela até a estação e na volta vejo a cidade acordando, com seus mendigos e pessoas fazendo fila esperando que os cafés abram. Na porta de uma Starbucks ainda fechada alguém grita: “Coffee!”.

O casal ítalo-australiano, Roberto e Katharine, quer ver o túmulo de Bruce Lee e a casa onde Kurt Cobain morreu; o outro casal quer ir no museu de arte. Fico com a primeira opção, mesmo que meio mórbida.
Roberto e Katherine em busca de Bruce Lee

Achado. E agora?
No cemitério, que fica na região mais bonita e arborizada da cidade, ficamos um bom tempo procurando o túmulo de Bruce Lee. Roberto explica a Katharine quem, afinal, é Bruce Lee e por que ele é importante. Ele acredita em algumas teorias conspiratórias de que a máfia matou Bruce Lee e seu filho, Brandon Lee, que morreu com um tiro durante uma filmagem. Rodamos o cemitério inteiro, e achamos vários túmulos de Lee, mas não no nosso. Talvez metade dos túmulos sejam de chineses. Um grupo de chineses, adultos, mulheres e crianças, se dirige cheio de certeza a um túmulo e os seguimos. Antes que eu pergunte se ele sabe onde fica o do Bruce Lee, ele me pergunta se nós sabemos. Também estão perdidos. Roberto não desiste. Nos separamos e saímos andando de novo pelo cemitério. Depois de meia hora, o grupo de chineses começa a acenar para nós entusiasmadamente, acho até que chegam a pular. Encontraram. Em cima do túmulo há alguns presentes, como camiseta e flores, e várias moedas de 1 centavo. Os chineses se revezam  para tirar fotos ao lado do túmulo. Roberto e Katharine não tiram sequer uma foto. Não sou fã de cemitérios, e os túmulos desses atores não me despertam nenhum sentimento. Não sei o que as pessoas que estão num funeral bem próximas dali pensam desse grupo de turistas fotografando e pulando. Mas talvez faça parte, afinal já sabiam que era um cemitério-ponto turístico.  No parque ao lado do cemitério assistimos dois caras andarem numa corda bamba. Não é por dinheiro, estão ali sozinhos só por diversão. Cada um de uma vez, eles atravessam a corda (uma fita na verdade) de um ponto até o outro. Pergunto se eles conseguem andar os dois ao mesmo tempo, um em cada ponta. Dizem que é difícil, mas aceitam o desafio. Começo a filmar, depois de alguns passos hesitantes em cima da corda, ambos caem no chão. Fico pensando se o meu desafio, que despertou a vaidade deles, não foi apenas inveja minha. Não acompanho o casal na busca pela casa onde o vocalista do Nirvana se matou. Nos separamos no ônibus, é a última vez que os vejo, pois estão partindo para uma festa de casamento da irmã de Katharine em Ashland, no Oregon. Antes de descerem, ele  diz que Ashland fica no meio do caminho até San Francisco, onde planejo ir mais tarde, e que eu posso ficar na casa da família dela quando passar por lá.


No resto do dia caminho pela cidade em busca de restaurantes, pra fazer posts pra outro blog. De volta ao quarto, falo finalmente com o coreano. Ele é gordo e grande e diz que prefere lugares quietos, onde pode ficar na dele. Morou em Victoria, BC, por 11 meses. Victoria é um lugar bonito mas extremamente pacato, onde as pessoas vão depois que se aposentam. Ele disse que achava lá ótimo.

Trouxe apenas dois livros comigo, deixando o resto no apartamento em Vancouver. São dois do haruki Murakami – 1Q84 e The wind-up bird chronicle. 1Q84 tem mais de 900 páginas em capa dura, e tento desesperadamente terminar para poder me livrar de mais um peso (a mochila menor já  começou a soltar uma das alças). Lio no lounge do albergue, onde algumas pessoas comem e outras ficam no computador. Duas mulheres conversam na mesa ao lado e reconheço o sotaque canadense. Pergunto, mas com medo de errar, “Vocês são canadenses?” Sim, e vão se mudar pra North Vancouver em breve, e falo um pouco sobre lá, pois foi o primeiro lugar onde morei. É a primeira vez delas num albergue. Como meus companheiros de quarto já foram embora e o coreano só dorme, achei que depois de cinco minutos de conversa elas poderiam me convidar pra dar uma volta onde quer que eles estivessem indo. Se despedem sem um convite. Então saio pra dar mais uma explorada pela cidade, dessa vez pelos labirintos do mercado público já fechado, cheio de escadas e corredores que te levam de um lado a outro, em 3 andares.  Ouço música vindo de um dos corredores, sigo e vejo uma festa, um vernissage: há telas pintadas espalhadas pelo local e champagne e canapés, ou algo do tipo. Como meus tempos de rato de vernissage já passaram, sigo reto e atravesso o corredor até um ponto escuro novamente.

De volta ao albergue, sento numa mesa onde cabem seis pessoas. Leio um pouco e observo um pouco. Na minha frente, um coreano lê algo que parece ser a Bíblia; numa das pontas, uma japonesa acessa a internet e por vezes se interrompe para consultar um dicionário eletrônico portátil; na outra ponta, uma chinesa assiste a clipes de músicas românticas e canta junto, baixinho. Numa outra mesa, um cara de uns 30 anos bebe uma cerveja muito sério, todo encolhido, parecendo sofrer. Me viro para a Japonesa, de cabelos curtos desgrenhados. Ela  é pequena e baixinha, como bem convém a uma japonesa. O Nome é Yuri Ota. Ela veio de bicicleta de Vancouver a Seattle, e o plano é seguir viagem ao sul por um ano, indo até Ushuaia, no extremo sul da América do Sul. Ela não fará o trajeto todo de bicicleta, pois pegará alguns ônibus no caminho, mas de Lima, Peru, até a o ponto no extremo sul ela segue apenas de bike. Demonstro surpresa, pois, como mencionei antes, ela é pequena, não parecendo ser do tipo atlético. Ela diz que apenas anda de bicicleta no Japão, e que já pedalou o Japão inteiro, e que outros japoneses amigos dela já fizeram o percurso até Ushuaia e até ao redor do mundo. Ela parece cansada, só veio passar uma noite em Seattle mesmo, e no dia seguinte pela manhça já parte. Pergunto se ela bebe vinho, acreditando que não, afinal é uma atleta. Mas ela diz que sim, e ela aceita que eu traga as mini garrafas que tenho guardadas  no quarto. Ofereço à chinesa cantora, mas ela agradece dizendo que já vai dormir. Digo a Yuri que deve escrever um blog contando a viagem dela, pra eu poder acompanhar. Ela fala que tem um, mas em japonês, e que o inglês dela não é bom o bastante então ela prefere não arriscar.

Na manhã seguinte já há alguns tipos diferentes no salão do café da manhã. Um senhor  grande e gordo de terno e gravata, suando e destoando um pouco dos demais. O depressivo da cerveja da noite de ontem também está lá, agora encolhido tomando café preto, sem açúcar, imagino eu.  Bebebndo meu suco  ultra doce e torrada de café da manhã, Yuri aparece  no momento em que leio a última página do meu 1Q84.

Nenhum comentário:

Postar um comentário